Foi publicada a Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio, que aprova o Regime da Reorganização Administrativa Territorial Autárquica. Sem a audição das populações por via de referendo, o Bloco de Esquerda recusa aprovara a extinção de qualquer freguesia. Por isso, hoje mesmo, poucos minutos depois da publicação da Lei, o Grupo Municipal do BE na Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul deu entrada de um Projecto de Deliberação para assegurar a realização de referendo local neste concelho sobre a temática. Porque aqui, o Povo é quem mais ordena!
Projecto de Deliberação
Projecto
de Deliberação para a Realização de Referendo Local relativamente à pronúncia da
Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul sobre a reorganização territorial
autárquic,a a efectuar nos termos do artigo 11.º, n.º 1 e n.º 3 da Lei n.º
22/2012 de 30 de Maio
Ex.ma
Senhora Presidente da Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul
Os deputados municipais, eleitos pela BE para a
Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul, ao abrigo do disposto no artigo 10.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de
Agosto, com as
alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei
Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro, vêm
apresentar Projecto de Deliberação para a Realização de Referendo Local
relativamente à pronúncia da Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul sobre a
reorganização territorial autárquica a efectuar nos termos do artigo 11.º, n.º
1 e n.º 3 da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio.
Para tanto requerem a Vossa Excelência a convocação de sessão ordinária ou extraordinária da
Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul, no prazo de 15 dias após o
exercício ou recepção da iniciativa referendária, para deliberação sobre a mesma
(artigo 24.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de
24 de Agosto, com as
alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei
Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro,).
Mais requerem que,
pese embora não ser obrigatório nos termos do artigo 24.º, n.º 2 da Lei
Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º
3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro, que seja solicitado
à Câmara Municipal de S. Pedro do Sul a emissão de parecer.
Nota Justificativa
Considerando que:
1 - Foi publicada a Lei n.º 22/2012,
de 30 de Maio, conferindo competência às Assembleias Municipais para se
pronunciarem sobre a reorganização administrativa do território das freguesias
(artigo 11.º, n.º 1 e n.º 4), sendo tal competência exercida nos 90 dias
posteriores à entrada em vigor da lei (artigo 12.º).
2 - As
divisões administrativas são, por força das dinâmicas económicas e demográficas,
mutáveis. No entanto, há que ter consciência da forte e arreigada identidade
local de muitas freguesias e municípios do nosso país, com consequências ao
nível da própria representação política enquanto comunidade.
3 - A lei que enquadre as dinâmicas da divisão
administrativa das autarquias locais, deve garantir uma adequada participação e
adesão das populações. Aliás, a história ensina-nos isso com o célebre episódio
da Janeirinha, revolta popular vitoriosa em 1868, especialmente direccionada
para uma grande redução de freguesias e municípios operada pela Lei da
Administração Civil de 1867, também conhecida como Lei Martens Ferrão.
4 - No quadro actual, Portugal é um dos países da
União Europeia com maior dimensão média dos Municípios, e quanto a uma eventual
classificação do número de freguesias como elevado, há que lembrar que as
mesmas apesar de ainda disporem de poucas competências e apenas cerca de 0,1%
da despesa inscrita no Orçamento de Estado, têm uma área média idêntica à média
dos municípios de vários Estados membros da UE.
5 - A
Carta Europeia de Autonomia Local, vem estabelecer no seu artigo
4.º, n.º 6, que “As autarquias locais
devem ser consultadas, na medida do possível, em tempo útil e de modo adequado,
durante o processo de planificação e decisão relativamente a todas as questões
que directamente lhes interessem”.
6 - O artigo 5.º da Carta Europeia de Autonomia
Local estabelece a obrigatoriedade de audição das autarquias locais
interessadas relativamente a qualquer alteração dos limites territoriais
locais, eventualmente por via de referendo, nos casos em que a lei o permita.
7 - A Carta Europeia da Autonomia Local é um
tratado internacional que vincula o Estado Português, Cumprindo ao Estado, e às
autarquias locais honrar os compromissos internacionais da República
Portuguesa, decorrentes do artigo 5.º da Carta Europeia da Autonomia Local, da
qual a República Portuguesa é parte, que determina a realização de referendo
nestes casos, quando legalmente possível.
8 - A expressão
“eventualmente por referendo, quando legalmente admissível” do artigo 5.º da
Carta Europeia da Autonomia Local tem de se referir, no que à expressão
“legalmente” respeita, à própria abertura constitucional para o efeito, que
como abaixo se verá, é clara nesta matéria.
9 - O Tribunal Constitucional considerou já
admissível o referendo local nesta matéria - veja-se o teor dos Acórdãos do
Tribunal Constitucional n.º 390/98, n.º 113/99, n.º 518/99, que abrem a porta
ao referendo local nesta matéria - observados os requisitos legais, e a partir
do momento em que a Assembleia da República solicite aos órgãos autárquicos
competentes os pareceres que legalmente lhes compitam.
10 – Nem se pode vir invocar a alteração do
Regime Jurídico do Referendo Local, ocorrido após a prolação dos acórdãos
citados, designadamente a proibição de referendos locais em matéria de reserva
de competência legislativa da Assembleia da República (artigo 4.º, n.º 1,
alínea a) da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto,
com as alterações
introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica
n.º 1/2011, de 30 de Novembro), uma
vez que, este referendo em nada condiciona a actividade desse órgão de
soberania, respeita apenas ao exercício de uma competência própria e exclusiva
da Assembleia Municipal, nos termos dos artigos 11.º, n.º 1 e n.º 4 da Lei n.º
22, de 30 de Maio.
11 – E muito menos se pode invocar a vinculação
das Assembleias Municipais à emissão obrigatória de pronúncia conforme, como
motivo de exclusão do recurso ao referendo local nesta matéria (artigo 4.º, n.º
1, alínea b) da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto,
com as alterações
introduzidas pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica
n.º 1/2011, de 30 de Novembro), visto que a
pronúncia não é obrigatória e pode até ser desconforme com os critérios
estabelecidos pela Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio (ver artigo 13.º, n.º 2 e
artigo 15.º da Lei n.º 22/2012, de 30 de Maio a contrario sensu).
12 – Aliás, o Professor Doutor
Jorge Miranda, em anotação ao artigo 240.º da Constituição da República
Portuguesa, in Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III, Coimbra Editora,
2007, a páginas 479: “E como a criação ou extinção de municípios,
bem como a alteração das respectivas áreas, requer a consulta dos órgãos das
autarquias abrangidas (artigo 249.º), nada impede que aí se realizem referendos
– vinculativos quanto ao sentido da pronúncia a emitir por esses órgãos (cfr.
Artigo 219.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto.”.
13 – Assim, a realização de referendos locais
sobre esta matéria não resulta numa violação da constituição, antes resulta no
seu cabal cumprimento, designadamente das normas de direito internacional
vigentes nos termos da Constituição e de carácter supra legal, nos termos do
artigo 8.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
14 – Assim, a interpretação do artigo 4.º, n.º 1
alínea a) da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de
Agosto, no sentido de impedir o recurso ao referendo local quanto a matérias incluídas
nas competências próprias dos órgãos das autarquias locais em matéria de
criação, extinção e modificação territorial de autarquias locais, seria
inconstitucional, o que expressamente se invoca, por violação do artigo 5.º da
Carta Europeia da Autonomia Local e, consequentemente, do artigo 8.º, n.º 2 da
Constituição da República Portuguesa.
15 – Da mesma forma que a exclusão
da sujeição destas matérias a referendo local por força da sua eventual
inutilidade, considerando o prazo de 90 dias estabelecido no artigo 12.º da Lei
n.º 22/2012, de 30 de Maio, determina a inconstitucionalidade dessa norma, que
expressamente se invoca, considerando que a mesma violaria materialmente a
sujeição a referendo prevista no artigo 5.º da Carta Europeia da Autonomia
Local, esvaziando-a de qualquer efeito, e, consequentemente, violando o artigo
8.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa.
14 – De resto, o recurso ao referendo nesta
matéria encontra sólidos antecedentes na tradição histórica portuguesa, com
expressão na I República, com a Lei n.º 621, de 23 de Junho de 1916, que foi,
aliás, aplicada em várias situações.
14 - A iniciativa de
referendo local compete aos membros do respectivo órgão deliberativo (artigo
10.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas
pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de
30 de Novembro).
15 - Os actos em procedimento de
decisão, ainda não definitivamente aprovados, podem constituir objecto de
referendo local (artigo 5.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de
Agosto), suspendendo-se o procedimento
até à decisão do Tribunal Constitucional sobre a verificação da
constitucionalidade ou legalidade do referendo local, ou, no caso de efectiva
realização do referendo, até à publicação do mapa dos resultados do referendo
(artigo 5.º, n.º 2 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei
Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de
Novembro).
16
– Os referendos locais poderão comportar 3 perguntas (artigo 7.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei
Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de
Novembro), não podendo ser
realizados simultaneamente mais de um referendo local sobre a mesma matéria
(artigo 6.º, n.º 3 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24
de Agosto, com as alterações introduzidas
pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de
30 de Novembro).
17 – É assim possível submeter a
referendo local a matéria constante da eventual pronúncia da Assembleia
Municipal, assegurando a efectiva oportunidade de audição dos cidadãos
eleitores e cumprindo-se o comando do artigo 6.º, n.º 3 e 7.º, n.º 1 da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei
Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de
Novembro.
18 – As forças políticas e
elementos que integram a Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul, não se
pronunciaram, aquando da sua eleição sobre uma eventual reorganização
territorial das freguesias, em concreto ou abstracto, carecem de uma inequívoca
legitimidade política para decidir nesta matéria.
19 – Em sessão ordinária realizada
em 6 de Fevereiro de 2012, a Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul aprovou
uma moção deliberando: “1 – Assumir a defesa da realização obrigatória de referendos locais, nas
autarquias afectadas, quando esteja em causa a criação, extinção, fusão ou
alteração territorial das autarquias locais. 2- Rejeitar a extinção de qualquer
uma das freguesias que integram o Município de S. Pedro do Sul.”.
20 – Em
sessão ordinária realizada em 23 de Abril de 2012, a Assembleia Municipal de
S. Pedro do Sul aprovou uma moção deliberando: “1 – Repudiar o Decreto da Assembleia da República originado pela
Proposta de Lei n.º 44/XII. 2 – Defender a audição das populações sobre a
modificação, extinção, fusão e alteração territorial das autarquias locais,
através de referendo, dando cumprimento ao artigo 5.º da Carta Europeia da
Autonomia Local.”.
21 –
Apesar destas posições de princípio, a Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul
sempre se submeterá, nos termos da lei, aos resultados de um referendo local
que se venha a realizar sobre esta matéria.
22 – As
freguesias de S. Pedro do Sul e Várzea apresentam-se territorialmente
contínuas, sendo igualmente contínua a mancha de edificação entre as duas
freguesias, e havendo inúmeros equipamentos públicos e privados quotidiana e
comummente utilizados pelas populações destas duas freguesias.
23 – A
cidade de S. Pedro do Sul é exclusivamente constituída pela totalidade das
freguesias de S. Pedro do Sul e Várzea, nos termos do artigo único da Lei n.º
67/2009, de 6 de Agosto, sendo simultaneamente a sede do Município.
24 –
Por isso, os cidadãos das freguesias de S. Pedro do Sul e Várzea merecem ver
discutida a reorganização territorial destas freguesias, de forma específica e
diversa das restantes freguesias.
Proposta
A
Assembleia de Municipal de S. Pedro do Sul delibera, nos termos do artigo
23.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas
pela Lei Orgânica n.º 3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de
30 de Novembro, aprovar a realização
de um referendo local, submetendo ao Tribunal Constitucional a sua fiscalização
preventiva, nos termos do artigo 28.º da Lei
Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, com as alterações introduzidas pela Lei Orgânica n.º
3/2010, de 15 de Dezembro, e Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro, com as seguintes perguntas:
“ 1 – Concorda
que a Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul se pronuncie a favor da agregação
das freguesias de S. Pedro do Sul e de Várzea, passando as mesmas a constituir
uma única freguesia?
2 – Concorda
que a Assembleia Municipal de S. Pedro do Sul se pronuncie a favor da
reorganização das restantes freguesias integradas no Município de S. Pedro do
Sul, promovendo a agregação, fusão ou extinção de qualquer uma delas?”
S. Pedro
do Sul, 30 de Maio de 2012
Os
deputados municipais eleitos pelo Bloco de Esquerda,
Rui
Costa
Alberto
Claudino Figueiredo
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